Por volta de nove anos atrás estava eu, ainda como missionário redentorista, na biblioteca do convento no Santuário Nacional perscrutando os relatos históricos da maior devoção mariana do país quando, de passagem pelos livros, deparei com um opúsculo intitulado Aos pés da Mãe.
Imediatamente me recordei da espiritualidade mariana e cristológica do grande pai da Teologia Moral, Santo Afonso Maria, que, em seus escritos sobre a busca da prática de amar a Jesus Cristo, ensina que “todos podem ser santos, cada um em seu estado de vida”.
Recordei-me, igualmente, de que ele nos estimulava a rezar bem perto do povo, aliás, como o povo, e então, fui tentar fazer isso e tudo se configurou na basílica histórica de Aparecida, onde me fiz romeiro durante os anos em que aí estive. Várias vezes fui ao meio do povo para visitar a imagem de Nossa Senhora; queria ouvir as conversas, escutar as orações que, às vezes, eram tão marcantes e em voz alta. Foi aí que essa expressão me fez cair em mim: todos estamos aos pés da Mãe.
De fato, desde criança, aos pés da mãe corríamos diante do medo e das ameaças infantis de nosso mundo ainda pequeno. Aos pés da mãe corríamos quando algo não dava certo em nossa vida. Aos pés da mãe há sempre consolo e consolação, abraço afetuoso, colo materno e a certeza de que, mesmo quando fazemos o que não devemos, é aos pés dela que devemos sempre estar.
Essa expressão faz ainda mais sentido quando estamos junto com o povo, na fila que passa atrás do altar da basílica histórica, porque, quando passamos aos pés da imagem, o olhar é para cima, a postura é de humildade, busca-se o Céu. Por conseguinte, o melhor lugar: aos pés da Mãe.
Às quinze horas, a consagração, na voz do Padre Vítor Coelho, também me chamava a atenção, não só pela sua bela voz rouca e entonação perfeita, mas também pela música de fundo: “Rogai por nós, ó Mãe, tão pia”, sobretudo a versão primeira, entoada pelo antigo coral da basílica. Essa canção, que sempre esteve ao fundo da oração da consagração, cunhada pelo apóstolo de Aparecida, também nos revela a mesma verdade que aprendi aos pés dela: “infeliz quem não te conhece”, diz a letra da canção filha de seu tempo e da teologia vigente à época.
Na basílica nova, igualmente, após enfrentar as filas enormes, estamos aos pés da imagem mais querida do Brasil, olhando-a e conversando com a pessoa de Maria. A relação entre o que me ocorreu naquela tarde na biblioteca do convento, lendo e meditando aquele opúsculo, e o fato de me propor a estar junto ao povo, aos pés da Mãe, fez renascer uma devoção e piedade popular em mim que, diga-se de passagem, não se aprende nas universidades, nem nos cursos, nem nos livros; neles, há indicações e proposições, mística mesmo só se propondo, experimentando, vivendo. Quem se faz romeiro de Aparecida não volta vazio, volta cheio, repleto do afeto materno e do regaço acolhedor de uma mãe que olha seus filhos, a seus pés, e se compadece de suas aflições e necessidades.
Em minha história, como padre devoto de Maria, há vários momentos simples e significativos, como esse,afinal, ela é “Maria de Nazaré, Maria do povo, Maria de Deus”. Para nós ela é Mãe! Resta-nos ser povo, Igreja por inteiro, comunidade de comunidades e estar a seus pés como filhos amados.