Estimado(a) leitor(a) da Revista Ave Maria, começo nossa reflexão mensal de novembro propondo a meditação em relação aos dons do Espírito Santo e a aplicabilidade deles nas famílias.
Esses dons, citados no Catecismo da Igreja Católica (1831) foram retirados do texto de Isaías 11,1-3. O temor de Deus é o dom que é a base para o desenvolvimento dos outros dons infusos e, neste mês, falaremos sobre mais um dos sete dons: o da piedade.
No mundo materialista, hedonista e distante de Deus em que hoje vivemos não são muitas as famílias que vivem uma intimidade com Ele e que pautam suas vidas segundo as santas leis do Senhor; também não são muitas as pessoas fervorosas no cumprimento das Escrituras, da vontade de Deus e na busca dos valores eternos. O dom da piedade nos leva a amar Deus profundamente e viver em comunhão com Ele, desejando sempre fazer a sua vontade, leva-nos a amar e reverenciar tudo que é de Deus: a oração individual, a oração litúrgica, a vida sacramental, a adoração ao Santíssimo Sacramento, a reza do santo Terço, o desejo de pregar a Palavra de Deus e sua meditação, a leitura de bons livros e o zelo pelas coisas sagradas.
A palavra “piedade”, no seu sentido original, diz respeito à atitude de uma criança para com seus pais: uma combinação de amor, confiança e reverência. Se essa é a nossa disposição habitual para com o nosso Pai, vivemos o dom da piedade. Esse dom do Espírito Santo é propriamente filial e recebe o nome de filho pois este tem piedade para com o pai, a piedade filial, ou seja, a devoção para com o Pai. Isso também estava presente no coração de Cristo, pois Ele, mesmo em sua profunda agonia no monte das Oliveiras, manteve-se fiel à vontade do Pai e se deu por nós para a remissão dos nossos pecados: “Todavia, não se faça o que eu quero, mas sim o que tu queres” (Mt 26,39).
A prática da devoção tem de atender à nossa saúde, às nossas ocupações e deveres particulares. A verdadeira devoção nada destrói; ao contrário, tudo aperfeiçoa. Essa devoção também se manifesta quando nós nos dispomos a passar pelo vale da sombra da morte, ou seja, pela aridez da nossa vida espiritual e não desistimos de Deus. Quando você, no meio da aridez e de tantas dificuldades da sua vida espiritual, diz “Ele está comigo, Ele é meu Pai, Ele não me abandona” isso representa esse magnífico dom.
Essa qualidade também está presente em Jesus, o Cristo, que se dispõe piedosamente, ou seja, filialmente, a estar com o Pai. Aqui vemos a íntima relação entre os dons do temor de Deus e da piedade: é sempre um coração de filho, o temor filial que sabe adorar e também um coração filial que sabe confiar, mesmo no meio da tempestade e da provação.
O dom da piedade nos leva a manter uma atitude de confiante intimidade e familiaridade com Deus; leva-nos a conversar com Ele como um filho conversa com seu pai ou com sua mãe, com naturalidade, espontaneidade, confiança e amor. Além disso, esse dom do Espírito Santo nos orienta divinamente em todas as relações que temos, não somente com Deus, mas, também, com o próximo, tornando-as mais profundas e perfeitas. São Paulo se refere a esse dom quando escreve “Porquanto não recebestes um espírito de escravidão para viverdes ainda no temor, mas recebestes o espírito de adoção pelo qual clamamos: ‘Aba, Pai’” (Rm 8,15). O Espírito Santo, mediante o dom da piedade, faz-nos, como filhos adotivos, reconhecer Deus como Pai. A piedade não estimula os cristãos apenas a cumprir seus deveres para com Deus de maneira filial, leva-os também a experimentar interesse fraterno para com todos os seus semelhantes.
O dom da piedade torna o cristão consciente de sua participação na família dos filhos de Deus e move-o a ultrapassar as categorias do direito e do dever, a fim de testemunhar uma generosidade que não mede esforços, desde que sirva aos irmãos. É o que manifesta São Paulo ao escrever “De muito boa vontade darei o que é meu, e me darei a mim mesmo pelas vossas almas” (2Cor 12,15).