Em 21 de outubro, celebra-se o Dia do Ecumenismo. A data representa uma oportunidade de aprofundamento sobre o tema e a promoção de ações concretas para a unidade cristã em todo o país.
Mais do que promover encontros entre lideranças de diferentes igrejas, o ecumenismo representa um movimento de unidade entre os cristãos chamados à oração, à vida fraterna e ao trabalho em comum.
Historicamente, a Igreja Católica se mostrou atenta à importância de dialogar com diferentes religiões. O grande estopim ocorreu em 25 de janeiro de 1959, quando o Papa João XXIII anunciou a realização do Concílio Ecumênico Vaticano II. A reflexão sobre essa dimensão estava no centro das intenções de São João XXIII e se ampliaria por toda a Igreja e pelos pontificados seguintes.
Com a morte do Papa João XXIII, o Santo Padre, Paulo VI, deu sequência à missão de unir diferentes igrejas cristãs em busca do anúncio do Evangelho. Em sua Exortação Apostólica Evangelii Nuntiandi, o Pontífice escreveu: “Como evangelizadores, nós devemos apresentar aos fiéis de Cristo não a imagem de homens divididos e separados por litígios que nada edificam, mas sim a imagem de pessoas amadurecidas na fé, capazes de se encontrar para além de tensões que se verifiquem, graças à procura comum, sincera e desinteressada da verdade”.
INSPIRADOS PELA UNIDADE
O Concílio Ecumênico Vaticano II, realizado entre os anos de 1961 e 1965, aprofundou a discussão ecumênica, abrindo novas possibilidades para o diálogo.
Desse grande encontro universal foi aprovado o Decreto Unitatis Redintegratio, uma importante diretriz para o diálogo ecumênico. Em sua abertura, o texto esclarece que “São numerosas as comunhões cristãs que se apresentam aos homens como a verdadeira herança de Jesus Cristo (…) mas têm pareceres diversos e caminham por rumos diferentes. Essa divisão, porém, contradiz abertamente a vontade de Cristo e é um escândalo para o mundo”.
O decreto define ecumenismo como as atividades e iniciativas que surgem a partir das necessidades da Igreja e das oportunidades oferecidas pelas transformações dos tempos. Como forma de transformar o diálogo ecumênico em um gesto concreto que perpetuasse por toda a história, o Decreto Unitatis Redintegratio lista oito práticas fundamentais:
- Trabalho de toda a Igreja: a abertura para a restauração da união deve ser comum a toda a Igreja (fiéis e pastores);
- A renovação da Igreja – sua importância e necessidade: fidelidade da vocação peregrina da Igreja e ao movimento de renovação em favor da unidade;
- A conversão do coração: conversão verdadeira e pessoal, suscitando ao Espírito Divino a caridade, a humildade e a mansidão em favor de servir aos irmãos;
- A oração pela unidade: o chamado ecumenismo espiritual prevê uma vida de oração constante pela unidade dos cristãos;
- O conhecimento dos irmãos separados: estudar aqueles que ainda se mantêm separados da unidade a fim de compreender e definir o melhor caminho para a fraternidade;
- A formação ecumênica: promover a formação teológica e de outras disciplinas a partir do ponto de vista ecumênico;
- A exposição clara e fiel da fé: apresentar a doutrina católica de forma com que possa ser compreendida pelos irmãos separados;
- A colaboração com os irmãos separados: cooperação de todos os cristãos para apresentar o verdadeiro rosto de Cristo e testemunho da esperança.
ECUMENISMO X SINCRETISMO
Mesmo sendo uma reflexão histórica, ainda existem confusões entre o que significa ecumenismo e sincretismo religioso.
Como entendido pelo magistério, o ecumenismo visa a um movimento de unidade entre as igrejas cristãs. Essa união ocorre, sobretudo, pelo diálogo, aproximação, cooperação e busca fraterna pela superação das divisões. Por outro lado, o sincretismo religioso acontece por meio de vínculos construídos de forma espontânea entre diferentes comunidades religiosas, provocando uma intersecção de seus símbolos e práticas.
ECOAR O AMOR DE CRISTO
Na perspectiva de responder ao apelo de diálogo ecumênico nasceu, em 1982, em Porto Alegre (RS), o Conselho Nacional de Igrejas Cristãs do Brasil (Conic). Sua fundação é fruto da união entre as igrejas católica, batista, anglicana, luterana e presbiteriana.
Dentre as principais atividades da comissão estão a Semana de Oração pela Unidade Cristã e o curso sobre ecumenismo “Itinerários dialógicos”.
O trabalho do Conselho Nacional de Igrejas Cristãs do Brasil ocorre, atualmente, baseado em um plano de ação que prevê a divulgação da raiz comum na fé em Jesus Cristo e do testemunho cristão da unidade na diversidade, baseando-se na vivência ecumênica e na fé da vida pública.
“A razão de o Conselho Nacional de Igrejas Cristãs do Brasil existir é a promoção da unidade cristã, testemunhar que as diferentes compreensões sobre a fé em Jesus Cristo não devem nos dividir. Pessoas cristãs têm o dever de se comprometer com a unidade e o diálogo, ambos são exigências da fé em Jesus Cristo. Em contextos de intolerância religiosa, cabe a nós testemunhar que Jesus Cristo jamais aceitaria a discriminação e o ódio religioso. Jesus sempre foi uma pessoa disponível para o convívio, o encontro e o diálogo. Viver a unidade cristã não é concessão, mas é compromisso de toda a pessoa batizada”, exortou Romi Márcia Bencke, pastora da Igreja Evangélica de Confissão Luterana no Brasil (IECLB) e secretária-geral do Conselho Nacional de Igrejas Cristãs do Brasil.
PEREGRINOS À CASA DO PAI
Já na Igreja do Brasil, a Comissão Episcopal para o Ecumenismo e Diálogo Inter-religioso é uma das doze comissões episcopais da Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB) e tem por atribuição promover a unidade dos cristãos e o diálogo inter-religioso em âmbito nacional. Para isso, conta com quatro grandes iniciativas: o apoio às dioceses, o acompanhamento e o incentivo às comissões bilaterais de diálogo ecumênico e inter-religioso, a oferta de cursos e estudos de formação ecumênica e a presença e participação no Conselho Nacional de Igrejas Cristãs do Brasi e em outras organizações de diálogo ecumênico.
Segundo o Padre Marcus Barbosa Guimarães, assessor da Comissão Episcopal para o Ecumenismo e Diálogo Inter-religioso da Conferência Nacional dos Bispos do Brasil, a missão evangelizadora da Igreja implica um caminho de amizade, diálogo e unidade.
“Os cristãos precisam dar testemunho de unidade como desejou o próprio Jesus: ‘para que todos sejam um e o mundo creia’ (Jo 17,21-23). A caminhada ecumênica nos faz lembrar que somos todos peregrinos à casa do Pai. O ecumenismo é uma rica contribuição para a unidade da família humana. A Igreja, ao firmar a dimensão ecumênica na missão evangelizadora, quer nos recordar que o ecumenismo é uma dimensão fortemente unida, intrínseca e constitutiva da nossa fé cristã”, frisou o Padre Marcus.
UM LUGAR DE RECONCILIAÇÃO
Fundada na década de 1980 pelos Frades Franciscanos da Reconciliação, a Casa da Reconciliação pertence, desde 1993, à Conferência Nacional dos Bispos do Brasil e é administrada pela Arquidiocese de São Paulo (SP). Ao longo de três décadas, o local se tornou referência para o ecumenismo e diálogo inter-religioso na cidade.
Em entrevista à Revista Ave Maria, o Cônego José Bizon, diretor da Casa de Reconciliação, recordou que os esforços da arquidiocese para promover o diálogo ecumênico começaram ainda na década de 1960 e que ao assumir a Casa da Reconciliação ampliou-se o trabalho de comunhão com cristãos: “A missão da Casa da Reconciliação é de construir pontes para encurtar distâncias e estreitar laços de amizade entre as diferentes religiões”, afirmou o Cônego Bizon.
Com tantas ferramentas, para o padre é fundamental que os católicos compreendam seu papel de construtores da unidade, assim como tem inspirado fortemente o Papa Francisco.
CASA DA MÃE, BERÇO DA UNIDADE
Parte da história ecumênica da Igreja foi construída no Brasil, em Aparecida (SP), durante a 5ª Conferência do Conselho Episcopal Latino-Americano (CELAM), no ano de 2007. O encontro teve como fruto o Documento de Aparecida, que apresenta as principais conclusões das discussões.
No centro do diálogo, o ecumenismo foi a pauta de duas seções e inspirou a continuidade da dimensão inter-religiosa como caminho de valorização da vida e evangelização. Além disso, a casa da Mãe Aparecida, conforme recordou o Cônego José Bizon, é, historicamente, um local de encontro entre diferentes religiões. Um exemplo claro é a realização da Assembleia-geral dos Bispos do Brasil no santuário, que prevê em sua programação a presença de lideranças das igrejas-irmãs para um dia de convivência. Em outros momentos, o santuário nacional também já acolheu encontros com a presença de representantes das igrejas ortodoxa, muçulmana, evangélica e tantas outras, sempre, segundo o Cônego Bizon, em clima de fraternidade.