O texto de João 14 reflete a situação de crise dos discípulos por não entenderem o caminho de Jesus. As palavras que Jesus pronuncia pretendem animá-los na esperança, fortalecê-los no meio da angústia, devolver-lhes o horizonte da vida. O Senhor lhes diz: “Não se perturbe o vosso coração. Credes em Deus, crede também em mim” (Jo 14,1).
A longa conversa (cf. Jo 13,1–17,26) que Jesus teve com os seus discípulos na Última Ceia é o testamento que nos deixou. Expressa a última vontade dele sobre a vida comunitária de seus discípulos. Foi uma conversa amiga que ficou na memória do discípulo amado e é também um exemplo de como a comunidade de João catequizava. As perguntas dos três discípulos, Tomé (cf. Jo 14,5), Filipe (cf. Jo 14,8) e Judas Tadeu (cf. Jo 14,22), eram também as perguntas das comunidades do fim do século I. Nas respostas de Jesus, as comunidades encontraram respostas para as suas dúvidas e dificuldades. Assim, o capítulo 14 do Evangelho de João foi, e ainda é hoje, uma catequese que ensina as comunidades a viver sem a presença física de Jesus, na fé e na esperança.
O texto do Evangelho de João é como um bonito tecido, feito com três fios bem diferentes e, ao mesmo tempo, muito parecidos. Esses três fios se misturam tão bem que às vezes nem se percebe quando se passa de um para outro.
O primeiro fio são os acontecimentos da vida de Jesus, ocorridos por volta do ano 30 d.C., lembrados pelas pessoas que conviveram com Ele e por aqueles que viram as coisas que fez e as palavras que ensinou. É o Jesus histórico, preservado nos testemunhos (cf. 1Jo 1,1).
O segundo fio são os acontecimentos e problemas da vida das comunidades da segunda metade do século I. Partindo da fé em Jesus e convictas de sua presença, as comunidades iluminaram esses fatos e problemas com as palavras e os gestos de Jesus.
Os comentários do evangelista constituem o terceiro fio (cf. Jo 2, 22; 12,37-43; 20,30-31).
Nos cinco capítulos que descrevem a despedida de Jesus (cf. Jo 13-17), nota-se a presença desses três fios: aquele em que Jesus fala, aquele em que falam as comunidades e aquele em que fala o evangelista, sendo às vezes difícil distinguir o que é de um e o que é de outro.
Jesus é o caminho para o Pai: nos versículos finais do capítulo 11 de João começa o relato da marcha de Jesus para Jerusalém. Lá Ele encontrará a morte. O Senhor sabe e essa consciência incomoda os discípulos. Jesus pede-lhes que aprofundem a fé naquela hora de prova, a adesão a Ele é adesão a Deus (cf. Jo 14,1). Os seguidores de Jesus são uma família, viverão, na casa do Pai (cf. Jo 14,2). O Senhor garante isso. Ele havia indicado o caminho, mas não é fácil entender seu ensinamento (cf. Jo 14,4). Tomé não tem certeza, sua pergunta suscita uma breve resposta de Jesus que constitui uma profunda revelação de si mesmo: “Eu sou o Caminho, a Verdade e a Vida” (Jo 14,6). Por meio de Jesus vamos ao Pai, sua vida e sua mensagem nos dizem que o caminho é a prática do amor a Deus e aos irmãos. É uma estrada exigente todos os dias. Estar com Jesus é estar com o Pai.
“Caminho”, “verdade” e “vida” são três palavras importantes. Sem um caminho, não se caminha. Sem verdade, não se acerta. Sem vida, só há morte! Jesus explica o significado. Ele mesmo é o caminho, porque “ninguém vai ao Pai senão por mim” (Jo 14,6). Ele é a porta por onde entram e saem as ovelhas (cf. Jo 10,9). Jesus é a verdade porque, olhando para Ele, vemos a imagem do Pai. Jesus é a vida porque, caminhando como Ele caminhou, estaremos unidos ao Pai e teremos vida em nós!
“Quem me viu, viu o Pai” (Jo 14,7): não temos que pensar em Deus como alguém distante e desconhecido. Quem quiser saber como é e quem é Deus Pai, basta olhar para Jesus. Ele o revelou nas palavras e nos gestos da sua vida. Pelo seu jeito de ser, revelou um novo rosto de Deus que atraiu o povo. Ele estava totalmente identificado com o Pai, portanto, em Jesus tudo é revelação do Pai. Os sinais e obras que Ele realiza são as obras do Pai. Da mesma forma, em nosso modo de viver e compartilhar, devemos ser revelação de Jesus. Quem nos vê deve poder ver e reconhecer algo de Jesus em nós.