Enquanto os evangelhos de Lucas e Mateus detalham o nascimento de Jesus, o Evangelho de João nos apresenta uma perspectiva diferente. Ele se inicia antes da criação, revelando Jesus como a Palavra de Deus, que era Deus e estava com Deus desde o princípio. Ao longo dos séculos, Deus revelou-se na criação, nas suas alianças com o povo de Israel, em Moisés, e revelou-se nos profetas. Aqueles que acreditaram nessa revelação tornaram-se filhos e filhas de Deus. Segundo João, a revelação mais plena ocorre com a encarnação do Verbo, demonstrando o amor infinito de Deus e superando a lei mosaica.
Ao ecoar as primeiras palavras de Gênesis, “‘No princípio” (1,1), João estabelece um paralelo entre os dois relatos, a criação original e a nova criação em Cristo. A encarnação do Verbo representa um novo ato criativo, em que Deus, em sua infinita misericórdia, decide habitar entre os seres humanos, inaugurando um novo momento na história da humanidade. A encarnação do Verbo é, portanto, o ponto culminante de toda a história da salvação.
Como em Gênesis, também aqui a luz é um elemento primordial ligado à vida e à superação das trevas. A luz, identificada com Cristo, representa a força salvadora de Deus, enquanto as trevas simbolizam o pecado e a morte. A oposição entre luz e trevas, presente em ambos os textos, adquire em João uma dimensão mais espiritual e teológica, simbolizando a força do bem sobre mal. Enquanto em Gênesis a escuridão é um estado da criação, em João ela representa as forças que se opõem à revelação divina. Em João, esses elementos são representantes de Cristo ou de seus oponentes. Assim como em Gênesis, a luz em João é sinônimo de vida e vitória sobre as trevas.
O evangelista João nos apresenta um paradoxo: Jesus, a luz do mundo, esteve entre nós e, no entanto, não foi reconhecido. Essa falta de reconhecimento não se limita à ignorância, mas à rejeição consciente de sua mensagem. Ao dizer que “o mundo não o conheceu”, João afirma que a humanidade se colocou em oposição a Deus. A cruz de Cristo revela a responsabilidade de cada um diante desse amor rejeitado e, ao mesmo tempo, a universalidade do amor divino. Conhecer Jesus implica mais do que ter informações sobre Ele, significa acolher seu ensinamento e seguir seus passos. A cruz revela também que mesmo aqueles que rejeitaram a luz podem encontrar perdão e restauração em Deus.
O Natal celebra o mistério da encarnação: Deus se fez homem, partilhando nossa condição humana em todas as suas dimensões, exceto o pecado. A afirmação de que Deus se tornou humano representa uma revolução teológica radical, tanto para os judeus quanto para os romanos e gregos. A figura de Jesus, um líder humilde e itinerante, contrasta com as expectativas do Messias poderoso, guerreiro, comum na cultura judaica. Para os gregos, a ideia de um deus se tornar homem era incompreensível, desafiando suas concepções mitológicas. O Natal celebra essa verdade paradoxal: Deus, em sua infinita misericórdia, fez-se homem para compartilhar nossa condição humana e nos oferecer a salvação. É a celebração desse amor divino que se fez próximo.
No Natal, a luz divina irrompe nas trevas do mundo, revelando-nos o rosto de Deus criança. Nascido numa manjedoura, Ele nos convida a um novo nascimento, à renovação da esperança. Aquele que criou os Céus e a Terra se faz pequeno para que possamos acolhê-lo em nossos corações. Sua presença transforma nossas vidas, convidando-nos a construir um mundo mais justo e fraterno seguindo seu exemplo de amor e compaixão. Da manjedoura, Deus olha-nos com o rosto de uma criança, cheio de esperança e vitalidade, dizendo a nós “Quero crescer na tua família, na tua comunidade, na tua vida”. Deus se faz próximo.