“E vós, quem dizeis que eu sou?”
(Lc 9, 20)“Seguir-te, Senhor, é perder-se e achar-se,
é cruz que diária e luz que guia.
É dizer-Te quem és com a vida inteira,
na dor que ama, na fé que não desvia.”
(Pe. Diego Lelis)
Há uma pergunta que atravessa os séculos com a força de um vento que não cessa. Não é uma pergunta de prova, nem uma curiosidade de mestre: é um chamado que toca a alma. “E vós, quem dizeis que eu sou?” (cf. Lc 9, 20).
Não se responde a essa pergunta com frases decoradas de catecismo. Ela exige mais: exige adesão, exige verdade de cada um de nós. Exige vida. Porque, na realidade, é como se Jesus dissesse: “Quero saber quem sou para você, no mais profundo da sua história, no lugar onde nascem as suas decisões, onde vivem suas alegrias e doem as suas cruzes.”
É revelador notar que essa pergunta nasce enquanto Jesus rezava num lugar retirado (cf. Lc 9,18). Como se o silêncio fosse a única linguagem capaz de traduzir o que é essencial. Há perguntas e respostas que só se escutam quando o coração aquieta. Há verdades que só se compreendem longe do barulho. E talvez o seguimento de Jesus comece por aí: pela escuta do coração, pela oração que desinstala, pela resposta que nasce no íntimo.
A resposta de Pedro — “Tu és o Cristo de Deus” — está certa, mas ainda é insuficiente. Porque logo em seguida Jesus revela o outro lado do Cristo: o lado da rejeição, da dor, da cruz. Como se dissesse: “Sim, sou o Messias, mas um Messias ferido. Sou o Cristo, mas um Cristo que sangra.”
E então, vem o convite que transforma tudo em caminho: “Se alguém me quer seguir, renuncie a si mesmo, tome sua cruz cada dia, e siga-me.” (Lc 9,23)
Seguir Jesus não é andar atrás de um ideal bonito. É caminhar com Ele, com as marcas e exigências do amor que se faz carne, que se deixa ferir, que se doa até o fim. É mais do que um gesto religioso — é uma escolha existencial que nos pede tudo. E que precisa ser feita de novo, a cada manhã.
É por isso que o seguimento de Cristo não se esgota num momento de entusiasmo ou numa emoção de retiro. É um ato contínuo de entrega. É aceitar que amar como Ele amou custará a vida inteira. Porque o amor, quando é verdadeiro, não se preserva — se oferece. O amor em Jesus é doação, e a consequência do amor é sempre a cruz — não como fim, mas como travessia.
Quem quiser salvar sua vida vai perdê-la — diz o Evangelho — mas quem a perder por causa d’Ele, a encontrará. Isso é uma revolução do espírito. Uma virada radical que nos ensina que a vida não se conquista acumulando, mas entregando. Não se vence se protegendo, mas se expondo por amor.
Seguir Jesus é viver para além de si mesmo. É deixar de se pertencer para pertencer ao Reino. É trocar os atalhos fáceis pela vereda estreita do Evangelho. É responder todos os dias à mesma pergunta: “E hoje, quem é Jesus para mim?” E permitir que a resposta não esteja apenas nos lábios, mas no modo como nos gastamos, no modo como amamos, no modo como vivemos.
Se hoje Ele te perguntar de novo — e Ele perguntará — não endureça o coração. Responder com a vida pode ser difícil, mas é o único caminho que nos devolve a nós mesmos e nos leva ao coração de Deus.