Passados sessenta dias após a Páscoa, a Igreja Católica celebra a Solenidade do Santíssimo Sacramento do Corpo e do Sangue de Cristo, mais conhecida como Corpus Christi. Essa data especial tem como objetivo central manifestar publicamente a fé no mistério da Eucaristia, que representa a presença real de Jesus Cristo na hóstia consagrada.
Em outras palavras, a festa de Corpus Christi é um momento para celebrar e reafirmar a crença de que, ao receber a comunhão, os fiéis comungam com o próprio corpo e sangue de Jesus, fortalecendo sua ligação com Deus.
Por meio de procissões pelas ruas, a comunidade católica demonstra publicamente sua fé e homenageia o Santíssimo Sacramento. Altares ornamentados, cantos religiosos e a participação fervorosa dos fiéis transformam essa data em uma grande festa de fé e devoção.
Mais do que uma simples celebração religiosa, a solenidade de Corpus Christi é um convite à reflexão sobre a fé e à renovação do compromisso com os ensinamentos de Jesus. É um momento para aprofundar a relação com Deus e reforçar a importância da Eucaristia na vida dos fiéis.
EUCARISTIA: ÁPICE DA FÉ CRISTÃ E SACRIFÍCIO DO SENHOR
A Eucaristia ocupa uma posição central na vida da Igreja. Na carta encíclica intitulada Ecclesia de Eucharistia (A Igreja vive da Eucaristia), o Santo Papa João Paulo II reafirma a importância da Eucaristia como “o cerne do mistério da Igreja”. O Concílio Vaticano II também havia declarado que o Sacrifício Eucarístico é a “fonte e o ápice de toda a vida cristã”.
Acima de tudo, a Eucaristia é o grande mistério da fé, conforme destacado no primeiro capítulo da encíclica. É o presente supremo de Jesus, que se oferece pela nossa salvação. Ao celebrarmos a Eucaristia, o evento salvífico da morte e ressurreição de Jesus torna-se verdadeiramente presente e eficaz. Esse sacrifício é tão importante para a salvação da humanidade que Jesus Cristo ascendeu ao Pai somente depois de nos deixar o meio de participar e desfrutar dos seus frutos salvíficos. A Eucaristia é o pão vivo que nos fortalece e revigora diariamente.
“A Eucaristia é o pão de cada dia que se toma como remédio para a nossa fraqueza de cada dia”, já expressava o filósofo cristão e doutor da Igreja Santo Agostinho. O próprio Papa Francisco em diversos momentos falou sobre a fortaleza espiritual desse banquete: “A Eucaristia não é um prêmio para os bons, mas remédio para os fracos”.
PRESENÇA DE CRISTO NA EUCARISTIA NA VIDA ESPIRITUAL DOS CATÓLICOS
Em entrevista à reportagem da Revista Ave Maria, o filósofo e professor de História, Alexandre Ferreira Santos, falou sobre o papel da contemplação do mistério da presença de Cristo na Eucaristia na vida espiritual de um fiel. De acordo com Santos, a compreensão desse fenômeno vai além do conceito metafísico de estar presente no mundo, adentrando a esfera da teologia e da experiência espiritual.
“É importante termos em mente que a ‘presença’, enquanto fenômeno, fundamenta o nosso ser no mundo, isso é algo metafísico. Quer dizer, quando estamos conscientes de que ‘estamos presentes’ abrimos mão de nossas ilusões de futuro e de nossas culpas do passado, por exemplo. Ao estarmos conscientes do tempo presente, inclusive temos a oportunidade de valorizar ausências que são queridas. Não é à toa que estão tão em alta as técnicas de mindfulness, de atenção plena etc.”, destacou o docente.
O filósofo prosseguiu relacionando essa compreensão com a presença de Cristo na Eucaristia, enfatizando que a experiência vai além de simplesmente estar consciente do momento presente. “Tudo porque Jesus nos chama a ir além de uma mera ‘metafísica da presença’ e experimentar a sua ‘teologia da presença’. Quando ele nos diz, em Mateus 28,20, ‘Eis que estarei convosco até o fim dos tempos’, Ele oferece para a vida espiritual do fiel cristão algo muito maior que qualquer técnica e meditação pode fazer por si mesma”, explicou o também teólogo.
Segundo Alexandre, estar na presença de Cristo na Eucaristia significa experimentar o reino de amor e o perdão alcançado na cruz, superando tanto as preocupações com o futuro quanto o peso das culpas passadas. “Em espírito e verdade somos capazes de alcançar tal status interior, mas Jesus Mestre não espera que alcancemos tal iluminação sozinhos, por isso oferece sua presença no Santíssimo Sacramento”, ressaltou.
Ao questionar o filósofo e teólogo Alexandre Ferreira Santos sobre o impacto da Eucaristia na vida comunitária dos católicos, sua resposta revela uma profunda reflexão sobre os princípios fundamentais da fé cristã e sua aplicação prática. “Jesus nos deixou a Eucaristia no pão e no vinho consagrados e nos colocou em torno da mesma mesa”, afirma ele, destacando a dimensão simbólica e comunitária da Eucaristia.
Ele enfatiza também a fé na capacidade humana de convivência e solidariedade, inspirada pela presença de Cristo na celebração. “Ao recebermos a comunhão, recebemos também o Espírito Santo, que inflama em nós o amor”, destaca o teólogo, ressaltando o papel transformador da Eucaristia na vivência do amor fraterno. Ele ressalta a importância de reconhecer a presença de Cristo em cada pessoa, especialmente nos mais necessitados, alinhando-se com a opção preferencial pelos pobres estabelecida em Mateus 25.
“Um estilo de vida simples, práticas sustentáveis e a militância contra o colapso climático são apelos que emergem das palavras da bênção sobre os dons do ofertório: ‘Bendito sejais, Senhor, pelo fruto da terra e do trabalho humano’. A vida brota da vida”, afirma o especialista, ecoando a ideia de que a plenitude da graça divina permeia toda a criação. Ele conclui destacando a necessidade de uma conversão pessoal e comunitária para promover a vida em abundância para todos os seres da criação.
A resposta do filósofo ressoa com a mensagem evangélica de amor, solidariedade e compromisso com os mais vulneráveis, inspirando os fiéis a viverem sua fé de forma autêntica e transformadora na comunidade e no mundo.
TESTEMUNHO PÚBLICO DA FÉ NAS RUAS DE SANTANA DE PARNAÍBA
A celebração do corpo de Cristo na cidade de Santana de Parnaíba (SP) sempre aliou a devoção à beleza dos enfeites confeccionados pela comunidade nas principais ruas do centro histórico e ao longo dos anos tornou-se uma das maiores manifestações religiosas do Estado de São Paulo.
Os tapetes são confeccionados com serragem colorida, que encantam pelo tingimento (são diversas cores vivas). Na confecção vale a criatividade de cada um, assim vários outros materiais são usados, como pó de café, casca de ovo, cal,
madeira, flores, tecidos e até esculturas de barro.
“O evento cresceu e cerca de 60 mil turistas visitam a cidade na data, que fica repleta de barracas de alimentação e artesanato. Toda a infraestrutura é cedida pela Prefeitura de Santana de Parnaíba e a organização da programação religiosa (missas, procissões etc.) é de responsabilidade da Paróquia Santa Ana, assim como a elaboração do tema, projeto de desenhos e distribuição dos tapetes, hoje confeccionados pela comunidade religiosa”, informou a assessoria de imprensa da Prefeitura Municipal de Santana de Parnaíba.
No próximo dia 30 de maio, a cidade se prepara para receber o Corpus Christi, evento anual marcado por sua tradição e significado religioso. Com o tema “Eucaristia, fonte de unidade e fraternidade”, a comunidade se reúne para celebrar a presença de Cristo na Eucaristia.
As atividades têm início às cinco da manhã, quando os moradores responsáveis pela confecção dos tradicionais tapetes de serragem se encontram na escola mais próxima do centro histórico. Após um café reforçado, cerca de mil voluntários das comunidades locais iniciam o trabalho de elaboração dos coloridos tapetes.
Às sete da manhã, no palco principal na praça 14 de Novembro, tem início uma série de momentos de oração e meditação, com destaque para as laudes às sete, o Terço mariano às oito, a pregação às nove e a santa Missa na matriz às dez e ao meio-dia. A programação ainda inclui a coroação de Maria às catorze horas, seguida pela santa Missa campal e procissão às quinze, com uma ressalva de que a programação está sujeita a alterações.
Após a conclusão da santa Missa, os fiéis saem em procissão pelas ruas do centro histórico, acompanhando o Jesus eucarístico e percorrendo quase um quilômetro de tapetes formados por serragem colorida. O evento, além de ser uma manifestação de fé, representa um momento de união e comunhão entre os membros da comunidade.