A CRUZ QUE GERA VIDA!

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“Pai, em tuas mãos entrego meu espírito.” (Lc 23,46)

É tradição na Sexta-feira Santa ser pronunciado com grande solenidade em algumas comunidades o Sermão das Sete Palavras. Faz parte das tradições da Semana Santa e esse sermão, em especial, na Sexta-feira Santa. 

Durante essa semana especial, podemos meditar sobre as sete palavras de Cristo na cruz. Enquanto esteve ali até dar o último suspiro, Jesus proferiu algumas palavras que ficaram marcadas como muitas que proferiu durante a vida e em toda Semana Santa meditamos sobre elas; isso pode ser todos os dias, mas, em especial na própria Sexta-feira da Paixão.

São sete expressões ditas por Jesus na cruz que os evangelistas recolheram e elas condensam a vida do crucificado. Nessas expressões revela-se a identidade de Jesus, quem Ele é e sua missão. São palavras que trazem um grande significado. Jesus esvazia-se totalmente, sai de si mesmo e se dirige aos outros.

A primeira palavra que Jesus profere é “perdão” – “Pai, perdoa-lhes, pois não sabem o que fazem” (Lc 23,34). Durante toda a sua vida, Jesus pregou o perdão e o amor de Deus a todos. Quando se encontrava com os pecadores, mostrava o rosto da misericórdia de Deus. O perdão fez parte da vida de Jesus e seus seguidores devem seguir seu exemplo. Jesus perdoa até aqueles que lhe condenaram à morte.

É difícil perdoar, ainda mais do jeito que foi a morte de Jesus, mas, temos que fazer o esforço de colocar aquilo que rezamos no Pai-Nosso em prática, perdoando todo aquele que nos ofende. Por mais que seja difícil perdoar é melhor fazer isso do que condenar. O perdão alivia a alma e nos deixa mais leves. Aprendamos com o Mestre, que perdoou até mesmo aqueles que o condenaram.

A segunda palavra é “Hoje estarás comigo no Paraíso” (Lc 23,43). Jesus morria entre dois ladrões enquanto um o insultava dizendo que se fosse de fato Deus os salvaria da morte. O outro mandou que esse se calasse e disse que ele não respeitava nem a Deus, que sofria o mesmo castigo que ele. Jesus disse a esse “bom ladrão”: “De hoje em diante estarás comigo no Paraíso”. O Paraíso não é simplesmente “um lugar”, mas um “lugar” de plenitude da vida, onde não haverá mais dor, sofrimento e pranto. Nesse lugar habitará a justiça e a paz. Que possamos construir o Paraíso aqui na Terra e vivê-lo de maneira plena no Céu. Construamos aqui a verdadeira paz e a justiça.

A terceira palavra é “Mulher, eis aí o teu filho; filho eis aí a tua mãe” (Jo 19,26). Com essa fala, Jesus entrega o discípulo aos cuidados da sua mãe e sua mãe aos cuidados do discípulo. Ao entregar Maria ao discípulo, Ele a entrega à humanidade inteira, por isso Maria é a mãe da Igreja e da humanidade. A partir desse momento, o discípulo a acolhe consigo e cuida dela. João, também de pé junto à cruz, representa todo seguidor fiel de Jesus, mesmo nos momentos de crise. Esse momento também nos ensina a não nos desesperarmos diante do sofrimento, pois o caminho do calvário é necessário para chegar à glória da ressurreição.

A quarta palavra é “Meu Deus, Meu Deus, por que me abandonaste”? (Mt 27, 46). Jesus se sente num momento de esvaziamento e abandono, Ele grita junto com toda a humanidade sofredora e grita por aqueles que resolveram abandonar Deus e seguir os seus próprios interesses. Nos dias de hoje, Ele continua gritando por tantos que o abandonam e não querem ouvir a sua voz. Logicamente, Jesus tinha certeza de que Deus estava com Ele e sabia que era necessário Ele passar pela cruz, mas gritou como uma forma de chamar a atenção de tantos corações insensíveis que de forma cruel entregaram o Filho do Homem.

A quinta palavra é “Tenho sede” (Jo 19,28). Jesus, sabendo que se aproximava a hora de entregar o seu espírito ao Pai e de selar de uma vez por todas a aliança entre o Céu e a Terra, disse essa a frase. Os soldados embebedaram vinagre na ponta de uma esponja e levaram-na à boca de Jesus. Ele disse: “Tudo está consumado” (Jo 19,30). A partir desse momento, Ele entregou seu espírito a Deus, dando o último suspiro.

Jesus gritou sua derradeira sede, um mundo sem dor, sem exclusão, sem violência, que tanto Ele pregou em vida, mas o coração das pessoas se fechou e não quiseram ouvir a sua palavra; pelo contrário, condenaram-no. Só o reconheceram como Filho de Deus quando Ele entregou seu espírito. Diziam “Realmente Ele era Filho de Deus”, mas era tarde demais. A sede de Jesus pode ser a nossa sede por um mundo novo com mais paz, amor, menos fome e menos desigualdade. Jesus gritou no intuito de ser escutado. Quantas vezes no mundo de hoje não escutamos a voz de Jesus? Ele precisa falar manso em nossos corações.

A sexta palavra é “Tudo está consumado” (Jo 19,30). Jesus, após beber do vinagre, disse que tudo estava consumado, ou seja, o tempo se cumprira, sua missão aqui na Terra terminara. Jesus esvaziou-se totalmente, abaixou-se totalmente e nos resgatou do pecado. Com sua morte, Ele desceu à mansão dos mortos para resgatar aqueles que foram feridos pelo pecado; resgatou Adão, o primeiro homem, e ressurgiu glorioso para nos ensinar o caminho da liberdade, longe do pecado. Do madeiro da cruz brotou a árvore da vida.

Que ao fim de nossas vidas possamos também dizer “Tudo está consumado”, olhar para trás e ver quanto de coisas boas fizemos e sermos merecedores da vida eterna. É muito triste chegar ao fim da vida e ver que não deixamos nada de bom. Jesus com certeza quando disse essa frase olhou para trás e viu quanto de coisas boas deixou para a humanidade.

A sétima palavra é “Pai, em tuas mãos entrego meu espírito” (Lc 23,46). Essa foi a entrega final de Jesus, já quando não suportava mais a dor dos braços esticados na cruz, dos pés juntos com prego e da coroa de espinhos cravada em sua testa. Jesus já havia suportado muito as dores, mas chegou um momento em que era melhor Ele se entregar e nos braços do Pai ser curado de suas dores. Na vida eterna não haverá mais dor nem sofrimento, será somente alegrias ao lado de Deus.

Quem dera ao fim de nossas vidas, quando não mais suportarmos as dores terrenas, entregarmos a Deus nossos espíritos, sermos acolhidos por Ele na eternidade e recebermos o alívio de nossas dores. A cruz é a expressão da máxima compaixão e comunhão com Jesus e com os sofredores. Ela aponta para aquele que foi fiel ao Pai e ao Reino.

Guardemos em nossos corações as sete palavras de Cristo na cruz. Que da cruz possamos chegar à glória eterna, ao lado de Deus.

D. Orani Tempesta, o. cist.

Arcebispo Metropolitano de São Sebastião do Rio de Janeiro (RJ).

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