“Sede santos como o vosso Pai celestial é santo.”
(Mt 5,48)
“Antes que eu te formasse dentro do seio de tua mãe,
Antes que tu nascesses, te conhecia e te consagrei.
Para ser meu profeta entre as nações eu te escolhi.
Irás onde enviar-te e o que te mando proclamarás!”
(Coral Palestrina)
Antes que o mundo nos chamasse por nomes passageiros, Deus já sussurrava em nosso íntimo um nome eterno: “santo”. Antes que nascêssemos, Deus já nos conhecia e nos chamava pelo nome (cf. Jr 1,5). Esse chamado não é privilégio de poucos, mas o fundamento da existência de todos. Não se trata de um ideal inalcançável, reservado aos altares e vitrais das igrejas, mas de uma vocação profundamente humana, enraizada no dom da vida que recebemos e que se desdobra, dia após dia, como resposta amorosa ao Criador.
Ser humanos já é um chamado. Respirar já é uma resposta. Cada batida do coração é um eco silencioso do Pai que nos convida à plenitude: “Sede santos, como vosso Pai do Céu é santo” (Mt 5,48). Essa é a primeira e mais radical vocação que habita cada pessoa, a vocação à santidade, à vida vivida como dom, entrega e missão. A santidade não começa com grandes gestos, mas com pequenos e fiéis “sins” dados no cotidiano: na paciência de um educador, no cuidado de uma mãe, na escuta silenciosa de um consagrado, no olhar compassivo de quem serve.
Agosto é, na tradição da Igreja do Brasil, o mês em que celebramos de maneira especial as vocações: ao ministério ordenado, à vida consagrada, à família, aos leigos e leigas, mas, antes de cada uma dessas formas concretas de seguir Jesus há uma vocação primeira que nos atravessa a todos: a vida como espaço de santificação, o existir como caminho de comunhão com Deus e com os irmãos e irmãs. A vida é dom, é milagre, é missão. É nesse chão da existência que floresce a voz de Deus, convocando-nos a descobrir a melodia única que Ele mesmo compôs em nosso interior.
Descobrir a própria vocação é como escutar, em meio ao ruído do mundo, um canto suave que nos chama pelo nome. É reconhecer que não somos obra inacabada do acaso, mas, sonho amado de Deus. Esse sonho se realiza não quando nos fechamos em expectativas humanas, mas quando nos abrimos à lógica do Evangelho: perder para ganhar, servir para viver o amor e amar até o fim. A vocação, qualquer que seja, nasce da escuta, amadurece no discernimento e frutifica na entrega.
Ser vocacionado é, antes de tudo, deixar-se alcançar. É permitir que Deus entre em nossa história e a transforme em bênção para os outros. A vocação não é um peso, mas uma centelha de sentido; não é um dever imposto, mas uma resposta amorosa que brota da liberdade. Essa liberdade, quando atravessada pelo Espírito, conduz-nos a lugares inimagináveis, ensina-nos a viver com inteireza e a amar com profundidade.
Neste mês vocacional, talvez a melhor pergunta não seja “O que devo fazer?”, mas “Quem sou eu aos olhos de Deus?”. A resposta a ela nos conduz à fonte da nossa identidade mais profunda. Somos filhos, somos chamados, somos enviados. Nesse caminho de escuta e resposta, Maria nos acompanha como mestra da vocação. Ela, que ouviu o chamado no silêncio de Nazaré e respondeu com um “sim” que mudou a história, continua a nos ensinar que vocação se vive com humildade, coragem e disponibilidade.
Deixemo-nos tocar novamente pelo sussurro do Pai. Talvez Ele não venha em forma de grandes revelações, mas no brilho de um gesto simples, na inquietação do coração, na alegria que ressurge quando servimos. Neste mês de agosto, abramos os ouvidos e os corações. A vocação nos chama. A vida nos espera. A santidade nos abraça. E Maria caminha conosco, como estrela que guia e coração que acolhe.