A EFUSÃO DO ESPÍRITO SANTO: PENTECOSTES (CF. JO 20,19-23)

No Evangelho de João, a ressurreição (Páscoa) e a efusão do Espírito Santo (Pentecostes) acontecem no mesmo momento. A situação dos discípulos, fechados por medo dos judeus, reflete a atitude da comunidade de João, que, receosa de um mundo hostil, é tentada a refugiar-se no seu próprio círculo. Jesus os envia para o mundo para serem suas testemunhas e do Pai. 

O presente relato baseia-se no cumprimento das palavras de Jesus. Ele tinha dito: voltarei a estar convosco (cf. Jo 14,18); o evangelista diz: apareceu no meio deles (cf. Jo 20,19). Jesus tinha assegurado: em breve me vereis de novo (cf. Jo 16,16ss); o evangelista afirma: os discípulos estavam radiantes por verem o Senhor (cf. Jo 20,20). Jesus anunciou: enviar-vos-ei o Espírito (cf. Jo 14,26; 15,26; 16,7ss), e tereis paz (cf. Jo 16,33); o evangelista retoma as palavras de Jesus: a paz esteja convosco e recebei o Espírito Santo (cf. Jo 20,21ss). Jesus afirmava: eu vou para o Pai (cf. Jo 14,12) que é também vosso Pai (cf. Jo 20,17).

No Evangelho, o primeiro encontro entre Jesus ressuscitado e seus discípulos é marcado pela saudação: “A paz esteja convosco”. A paz que Jesus dá é diferente da pax romana, construída pelo Império Romano por meio da violência (cf. Jo 14,27). A paz na Bíblia (shalom) é uma palavra rica em significados. Significa integridade das pessoas perante Deus e os outros, vida plena, feliz e abundante (cf. Jo 10,10). A paz é um sinal da presença de Deus, porque o nosso Deus é um Deus de paz. “O Deus da paz esteja com todos vós” (Rm 15,33). Nem todos acolhem a proposta de paz de Deus e provocam reações violentas. A paz que Jesus concede fortalece os membros da comunidade diante das perseguições. O próprio Jesus anuncia tribulações (cf. Jo 16,33). É preciso ter confiança, perseverar no Espírito para que um dia a justiça e paz de Deus triunfem (cf. Sl 85,11) e, então, o Reino de Deus será justiça, paz e alegria e estes serão os frutos do Espírito Santo (cf. Rm 14,17) e “Deus será tudo em todos” (1Cor 15,28).

O envio: “Como o Pai me enviou, assim também eu vos envio a vós” (Jo 20,21). De Jesus crucificado e ressuscitado recebemos a missão, a mesma que Ele recebeu do Pai. Para nós, repete: “A paz esteja convosco”. A repetição sublinha a importância da paz. Construir a paz faz parte da missão. A paz que Jesus nos deixa significa muito mais do que a ausência de guerra, significa construir um todo humano harmonioso, onde as pessoas possam ser elas próprias, com tudo o que precisam para viver, e onde possam viver felizes, em justiça e paz. Construir uma comunidade segundo a comunidade do Pai, do Filho e do Espírito Santo. 

A língua hebraica utiliza a mesma palavra para designar o vento e o espírito. Jesus soprou e disse: “Recebei o Espírito Santo” (Jo 20,22). O vento tem um objetivo, uma direção: vento do norte, vento do sul; da mesma forma, o Espírito de Deus (o vento de Deus) tem uma meta, um projeto que se manifesta de muitas maneiras nas obras que o Espírito realiza na criação, na história e especialmente em Jesus. A grande promessa do Espírito está presente nos profetas: a visão dos ossos ressequidos que se tornam vivos pelo poder do Espírito de Deus (cf. Ez 37,1-14); a efusão do Espírito de Deus sobre todas as nações (cf. Jl 3,1-5); a visão do Messias servo que será ungido pelo Espírito para restaurar a justiça na terra e anunciar a boa nova aos pobres (cf. Is 11,1-9; 42,1; 44,1-3; 61,1-3). Os profetas preveem um futuro em que o povo de Deus renascerá pela efusão do Espírito (cf. Ez 36,26-27; Sl 51,12; Is 32,15-20). Em João, essas profecias cumprem-se em Jesus. Como na criação (cf. Gn 1,1), assim o Espírito aparece e repousa em Jesus “do Céu em forma de uma pomba” (cf. Jo 1,32).

É o início da nova criação! Jesus pronuncia as palavras de Deus e nos comunica o Espírito em abundância (cf. Jo 3,34). As suas palavras são Espírito e vida (cf. Jo 6,63). Quando Jesus se despede, diz que enviará outro consolador, outro advogado que estará conosco, é o Espírito Santo (cf. Jo 14,16-17). Pela sua paixão, morte e ressurreição, Jesus assegura para nós o dom do Espírito. O primeiro efeito da ação do Espírito Santo em nós é a reconciliação: “Àqueles a quem perdoardes os pecados, lhes serão perdoados; àqueles a quem os retiverdes, lhes serão retidos” (Jo 20,23). Pelo Batismo, todos nós recebemos esse mesmo Espírito de Jesus (cf. Jo 1,33). O Espírito é como a água que brota do íntimo daqueles que acreditam em Jesus (cf. Jo 7,37-39; 4,14). O Espírito nos é dado para que possamos recordar e compreender o sentido pleno das palavras de Jesus (cf. Jo 14,26; 16,12-13). Animados pelo Espírito de Jesus, podemos adorar Deus em qualquer lugar (cf. Jo 4,23-24) e experimentamos a liberdade do Espírito: “Onde está o Espírito do Senhor, aí há liberdade” (2Cor 3,17), confirma São Paulo.

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